sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Abaixo o Desenvolvimento!!! (abaixo o desenvolvimento????)

Abandonemos o Desenvolvimento!
(trecho de “Rumo ao abismo?”, Edgar Morin, ed Bertrand Brasil)

"A ideia de desenvolvimento sempre implicou uma base tecnoeconômica, mensurável pelos indicadores de crescimento e dos lucros. Ela supõe de modo implícito que o desenvolvimento tecnoeconômico seja a locomotiva que naturalmente impulsiona, em consequência, um “desenvolvimento humano”, cujo modelo ideal e perfeito é o dos países considerados desenvolvidos, ou seja, os ocidentais. Essa visão pressupõe que o estado atual das sociedades ocidentais constitui a meta e finalidade da história humana.
O desenvolvimento “sustentável” não faz senão amenizar o desenvolvimento, por levar em consideração o contexto ecológico, mas sem questionar seus princípios; no desenvolvimento “humano”, a palavra humano é vazia de toda substância, a menos que não remeta ao modelo humano ocidental, que certamente envolve traços essencialmente positivos, mas também, vale repetir, essencialmente negativos.
Noção aparentemente universaliza, o desenvolvimento também constitui um mito típico do sociocentrismo ocidental, um motor de ocidentalização furiosa, um instrumento de colonização dos “subdesenvolvidos” (o Sul) pelo Norte.
O desenvolvimento ignora o que não é nem calculável nem mensurável, ou seja, a vida, o sofrimento, a alegria, o amor e sua única medida de satisfação se encontra no crescimento da produção e da produtividade, do lucro monetário. Concebido unicamente em termos quantitativos, ele ignora as qualidades da existência, as qualidades da solidariedade, as qualidades do meio, a qualidade da vida, as riquezas humanas não calculáveis nem negociáveis; ignora o dom, a magnanimidade, a honra, a consciência. Sua atitude nega os tesouros das civilizações arcaicas e tradicionais; o conceito cego e grosseiro de subdesenvolvimento desintegra as artes da vida e as sabedoras de culturas milenares.
O desenvolvimento ignora que o crescimento tecnoeconômico também produz o subdesenvolvimento moral e psíquico: a hiperespecialização generalizada, as compartimentalizações em todos os domínios, o hiperindividualismo, o espírito do lucro conduzem à perda das solidariedades. A educação disciplinar do mundo desenvolvido traz muitos conhecimentos, mas engendra um conhecimento especializado que é incapaz de compreender os problemas multidimensionais e determina uma incapacidade intelectual de reconhecer os problemas fundamentais e globais.

O desenvolvimento contém em si como benéfico e positivo tudo que é problemático, nefasto e funesto na civilização ocidental, sem por isso conter necessariamente o que há de fecundo (direitos humanos, responsabilidade individual, cultura humanista, democracia)."