segunda-feira, 24 de junho de 2019

Textão, Moro, Lula e a Corrupção

"De tanto debater in box (no FB e Twitter) repetindo sempre as mesmas coisa, resolvi fazer um textão numerado.
1."Corrupto"é todo aquele que age desonestamente, em benefício próprio ou de outros, em instituições públicas ou privadas.
2. Não sou historiadora, mas também não sou ignorante. A corrupção existe no Brasil, em todos os níveis e em todos os governos, desde o descobrimento. Havia corrupção na Monarquia, assim como na República. Havia corrupção nos governos militares, assim como nos democráticos. Sarney, Collor, Itamar, FHC, Lula, Dilma, Temer - em todos. Quem roubou mais? Quem roubou menos? Isso importa? Livros e mais livros já foram escritos sobre o tema, com os mais variados olhares. A "Trilogia da Ditadura", do Elio Gaspari (sim, são 3 livros muito bons), "A Privataria Tucana" do Amaury Jr, "O País dos Petralhas", do Reinaldo Azevedo, são ótimos livros de leitura fácil. Altamente recomendados pra quem acredita que "bom era no tempo da ditadura", "só o PT é ladrão", "Lula não sabia de nada".
3. Não existem "mocinhos" nessa nossa história recente. Sempre foi um jogo dinâmico de interesses, que convergem ou divergem, aproximando ou afastando aliados de ocasião. Grupos e subgrupos defendem seus projetos e propostas segundo sua visão de mundo, e organizam suas estratégias conforme as oportunidades se apresentam. Há os que se corrompem nesse processo (e corrupção não é só roubar - ver item 1). Acredito que também existem os que se mantém íntegros, apesar de tudo. Alguns exemplos me ocorrem, mas não vou citar aqui. 
4. É de uma triste estupidez crer e reproduzir teorias da conspiração ridículas e rebuscadas. Vale tanto para a "Facada do Mito" quanto para o "Show do Pavão". A verdade em geral é simples, e é o que parece ser. A verdade se apoia nos fatos, e mesmo que se viva em tempos de "pós-verdade" e que as tais "fake news" dominem as mídias sociais, não existe nada mais poderoso que a realidade. A realidade não precisa se esforçar, ela apenas é. E acaba se impondo, porque é só o que existe.
5. Sobre o período dos governos petistas, eu particularmente acredito que o partido mantinha relações pra lá de promíscuas com as empresas com as quais trabalhava. Acredito que o projeto de poder do PT incluía um projeto de financiamento do partido com dinheiro público. Acredito que muitas pesoas físicas se beneficiaram disso, enchendo as próprias contas bancárias com o dinheiro dos impostos que nós pagamos - e dinheiro de várias outras origens, que eu nem desconfio quais sejam.
6. De janeiro de 2003, quando Lula assumiu a presidência, até pouco antes das eleições de 2014, eu, que não sou economista nem socióloga, observei uma melhora indiscutível na vida das pessoas mais pobres. Vi e senti isso no meu dia-a-dia, com menos pessoas vivendo na pobreza, com notícias positivas na mídia mundial, e com um reconhecimento um tanto relutante na mídia local também. O que mais me impressionou foi o gradual desaparecimento de crianças "de rua", pedindo esmolas entre os carros parados no trânsito. Hoje há muita gente miserável de volta às ruas - mas não vejo crianças, ainda.
7. Na minha vida confortável de classe média, não notei maiores diferenças nos governos petistas. Os novos benefícios para os empregados domésticos impactaram muito pouco no meu orçamento, inclusive achei muito justo. Já as cotas nas universidades foi mais difícil de entender, justo no ano do primeiro vestibular do meu filho mais velho... Ele mesmo me convenceu que era uma indecência a competição nivelada entre desiguais. Eu calei a boca e fui aprendendo. 
8. Duas coisas me indignavam nos governos petistas: o presidente se orgulhar da sua pouca formação, como se isso fosse um exemplo a ser seguido - "vejam, eu não estudei e sou presidente". Na minha apinião, ele deveria aproveitar a visibilidade da presidência e estudar publicamente, divulgando e valorizando a complementação da sua formação. Outra coisa era a desculpa pronta para todos os gargalos da nossa infraestrutura precária, que não dava conta da entrada de tantos novos consumidores - "as elites não querem que os pobres andem de avião, as elites isso, as elites aquilo". Essa divisão entre "o povo" e "as elites" nunca me desceu bem. Presidente deve governar para todos, unir em vez de dividir.
9. De qualquer maneira, a minha percepção dos governos petistas até 2014 era de um jogo de ganha-ganha: parecia estar bom pra todo mundo. Também sentia a auto-estima dos brasileiros mais alta. Quem reclamar desse período com a cantilena monótona "16 anos de PT quebraram o país" está sendo hipócrita ou é muito mal-informado. Lula se reelegeu no primeiro turno e elegeu a Dilma(!). Que apesar de tudo teve quase 4 anos de governo muito bem avaliados, até que a crise mundial somou-se a sua incrível inabilidade política e falta de visão estratégica, levando o país ao desastre. O resto da história todo mundo conhece, ou deveria. Tem um documentário muito bom no Netflix, "A Democracia em Vertigem", e tem também o seriado "O Mecanismo", 1 e 2, que usa muita informação real nos roteiros. Gente de direita e esquerda pode assistir, amar ou se enfurecer, com um ou com outro, conforme a crença.
10. Não vou falar sobre o governo Bolsonaro. Está muito além da minha compreensão.
11. Cada um tem a sua convicção formada sobre a culpa ou a inocência do ex-presidente Lula nesse processo todo. Essa convicção depende muito mais das experiências e valores de cada um do que dos autos do processo. É um julgamento subjetivo, muitas vezes apaixonado, condenando ou absolvendo.
Quem acha que Lula é um ladrão e deve ficar na cadeia para sempre, defende que qualquer irregularidade ou ilegalidade cometidas durante o processo que levou Lula à prisão é justificada pelo fato de... ter levado Lula à prisão. Qualquer argumentação contrária bate em uma parede construída por um emaranhado de desinformação, inteligência mal-intencionada e militância devota.
13. Quem acha que Lula é um estadista iluminado e salvador da pátria, defende que as revelações do Intercept deixam claro que Lula é inocente de todos os malfeitos que a ele se atribui, e que a Lava Jato tinha o único objetivo de colocá-lo na prisão. Qualquer argumento contrário bate em uma parede de generalização desonesta, superficialidade e sim, militância devota.
14. Eu acho que, pelo que foi revelado até agora (e ninguém tem dúvida que o material é autêntico, embora tentem deixar meio nebulosa essa autenticidade), houve, sim, uma ação estratégica ilegal de funcionários públicos associados para impedir o ex-presidente de concorrer à presidência em 2018. Qualquer argumento contrário bate em uma parede construída por evidências gritantes.
15. Já que o argumento mais usado para defender incondicionalmente a Lava Jato é sempre o combate à corrupção, eu também acho que o processo do triplex e o processo do sítio estão irremediavelmente corrompidos pela atuação escandalosamente parcial de quem deveria ser isento. Qualquer argumento contrário se espatifa no muro construído pela Constituição e pelo Código do Processo Penal, além de mais meia-dúzia de regras jurídicas das quais eu só ouvi falar, porque não sou advogada - mas também não sou idiota.
16. Não tenho a menor ideia do que vem por aí. Mas de tédio ninguém morre neste País."

Maria Alice Machado, no Facebook.

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