segunda-feira, 24 de maio de 2010

O jeito brasileiro de falar português...

Escreve Jorge Amado em seu "Navegação de Cabotagem" que o escritor português Luiz Forjaz Trigueiro veio ao Brasil em 1964 só com roupas leves, para o calor baiano, mas "uma onda de frio abateu-se sobre a cidade" [Salvador] e o escritor decidiu comprar um agasalho. "Deteve-se ante uma loja: ali se exibia a peça exata que buscava"... "De lã, chique, discreta, na cor preferida, estava à sua espera. Luiz adentrou o estabelecimento, o vendedor acorreu solícito, colocou-se a seu serviço.
- Desejo comprar uma camisola - informou o literato luso, sorrindo com a delicadeza que o caracteriza.
Não menos delicado o balconista:
- O cavalheiro se enganou, aqui só vendemos artigos masculinos, mas na loja em frente, de artigos para senhoras, o senhor encontrará variado estoque de camisolas...
Não tendo entendido, algum engano havia, Luiz insistiu:
- Eu disse camisola...
- Já lhe disse que não temos - o caixeiro elevou a voz desconfiado que o simpático freguês fosse surdo de nascença.
- Como não tem, se acabo de ver na montra uma camisola castanha na medida própria?
- Onde disse ter visto camisola?
O balconista sentiu-se perdido, além de surdo o freguês falava uma língua desconhecida, nem espanhol, nem francês, menos ainda inglês, dialetos que o rapaz identificava, familiar sotaques e pronúncias. Não sabendo o que dizer, riu e coçou a cabeça. Um parvo, persuadiu-se Luiz Trigueiros, e, sem mais delongas, tomando-o gentilmente pelo braço - aos parvos deve-se tratar com firmeza sem , no entanto, abandonar a cortesia - , levou-o até a porta de onde, triunfante, mostrou-lhe a montra a camisola castanha:
- Ali está ela, a camisola, quanto vale?
A risada do rapaz não era mal-educada, mas continha uma ponta de deboche:
- Ilustre cavalheiro, fique sabendo que em bom português o senhor quer comprar um pulôver marrom igual ao que está na vitrine, não é isso? Por que não disse logo? Um suéter porreta e o preço é de arrasar...
Encontrei Luiz no hotel envergando a camisola castanha, ou seja, o pulôver marrom"... " o escritor estava indignado:
- O gajo diz-me duas palavras em francês, uma em inglês e afirma estar a falar em bom português!"

Este texto, dedico, carinhosamente, aos meu amigos portugueses da blogosfera. Que língua a nossa!!!

5 comentários:

carmen disse...

Muito interessante estas diferenças "linguísticas culturais"
rsrsrs

bjs

lux.de.luxo@gmail.com disse...

Adorável história.

Dona Sra. Urtigão disse...

E o melhor é que nenhum acordo ortografico vai mudar isso !
Gostei da historia.

Lou H. Mello disse...

Mais estranho ainda é um homem comprar cuecas em qualquer loja lá na terra mãe.

Fábio Adiron disse...

Assim como Shaw se referia aos EUA, Brasil e Portugal são dois países separados pela mesma língua