segunda-feira, 12 de maio de 2014

"Que regrettez-vous dans votre vie?"

Do que você se arrepende ou lamenta na vida?

Esta foi a pergunta que fizeram a Edgar Morin, numa entrevista em 1995, e essa é parte da resposta, conforme ele relata no diário "Chorar, Amar, Rir, Compreender" (ed SESC, 2012):

"Repenso meus erros políticos, cuja parte mais marcante foi, durante cinco anos, meu erro em relação ao comunismo stalinista. Provêm das mesmas origens que a minha lucidez. Meu julgamento combina, ou melhor, coloca em dialógica o realismo, a posição de princípio e a utopia ou ideal. O realismo conduz ao fatalismo, à aceitação do fato acabado e, além do mais, comporta em si uma falha: a crença de que o estabelecido é durável a longo prazo. Desse modo, em 1940-1941 acreditou-se  (eu pude acreditar) que a hegemonia alemã estava estabelecida por um prazo muito longo, e o realismo, por sua vez, conduziu à resignação e ao erro. De 1941 a 1947, acreditei ser realista esperar que o poder soviético, com o tempo, produziria um socialismo com rosto humano. E, durante um tempo aceitei em silêncio as piores mentiras e as piores ignomínias. Meus princípios conduzem à resistência haja o que houver: é minha posição no final de 1941 contra Vichy [governo francês adesista aos alemães] e a ocupação alemã e, depois, em 1951, contra a URSS stalinista.
A utopia, ou o ideal, consiste em esperar um mundo melhor (mas jamais, no meu caso, o melhor dos mundos). Em si mesma, minha dialógica comportava dificuldade, incerteza, aposta. Não me arrependo daquilo que continua a determinar meu julgamento, ou seja, esta dialógica realismo/princípio/utopia. Posso me arrepender de ter errado? Não, porque a infalibilidade é impossível. Posso lamentar, por minha demora, a cada vez, em me revoltar." (p 27, negrito meu)

Um comentário:

Anônimo disse...

Adoro o Morin. Que consistência... Que sabedoria para compreender que as coisas mudam, que a alma se transforma, que a vida se abre em possibilidades imprevistas e a gente escolhe de novo e de novo outras e novas (por vezes velhas) experiências... Um fofo. Um poeta.