quinta-feira, 24 de junho de 2010

Porque não há paz no mundo

Onde queres revólver, sou coqueiro
E onde queres dinheiro, sou paixão
Onde queres descanso, sou desejo
E onde sou só desejo, queres não
E onde não queres nada, nada falta
E onde voas bem alto, eu sou o chão
E onde pisas o chão, minha alma salta
E ganha liberdade na amplidão


Onde queres família, sou maluco
E onde queres romântico, burguês
Onde queres Leblon, sou Pernambuco
E onde queres eunuco, garanhão
Onde queres o sim e o não, talvez
E onde vês, eu não vislumbro razão
Onde o queres o lobo, eu sou o irmão
E onde queres cowboy, eu sou chinês


Ah! Bruta flor do querer
Ah! Bruta flor, bruta flor


Onde queres o ato, eu sou o espírito
E onde queres ternura, eu sou tesão
Onde queres o livre, decassílabo
E onde buscas o anjo, sou mulher
Onde queres prazer, sou o que dói
E onde queres tortura, mansidão
Onde queres um lar, revolução
E onde queres bandido, sou herói


Eu queria querer-te amar o amor
Construir-nos dulcíssima prisão
Encontrar a mais justa adequação
Tudo métrica e rima e nunca dor
Mas a vida é real e de viés
E vê só que cilada o amor me armou
Eu te quero (e não queres) como sou
Não te quero (e não queres) como és


Ah! Bruta flor do querer
Ah! Bruta flor, bruta flor


Onde queres comício, flipper-vídeo
E onde queres romance, rock’n roll
Onde queres a lua, eu sou o sol
E onde a pura natura, o inseticídio
Onde queres mistério, eu sou a luz
E onde queres um canto, o mundo inteiro
Onde queres quaresma, fevereiro
E onde queres coqueiro, eu sou obus


O quereres e o estares sempre a fim
Do que em mim é de mim tão desigual
Faz-me querer-te bem, querer-te mal
Bem a ti, mal ao quereres assim
Infinitivamente pessoal
E eu querendo querer-te sem ter fim
E, querendo-te, aprender o total
Do querer que há e do que não há em mim

Não há paz no mundo porque todos queremos, dos outros, coisas diferentes daquilo que eles são. E vice-versa.


(para ouvir essa linda canção de Caetano, clique no nome - O quereres)

3 comentários:

Vidal disse...

Nao sei se concordo ou nao... Você tem certa razao. Acho que talvez seja o meu ponto de vista.
Eu acredito numa paz onde cada um é o que é, e espera do outro que ela seja o melhor do que pode ser, mas sem imposiçao.

neli araujo disse...

Oi, Rubinho!

Que belo poema, amigo!
É de sua autoria?

Eu concordo com você, Rubinho!

Às vezes as pessoas (principalmente no mundo virtual)criam uma imagem da gente, que não corresponde à realidade...e então cobram coisas que não somos e nem podemos ser, sem nos tornarmos pessoas infelizes caso queiramos agradá-los!

Todos queremos ser respeitados em nossas escolhas!

Uma beijoca e um ótimo final de semana!

Neli

neli araujo disse...

Oi, Rubinho!
Acabei de ouvir "O quereres"! Obrigada pela dica!
Bom fim de semana para vocês!

Neli